“Meu coração estava cheio de vazio”
"Guardaria só para mim tamanha saudade. Passei o resto do dia assentado no alpendre frio e limpo, sem olhos para mais nada. Meu coração estava cheio de vazio. Quando a noite chegou fui para a cama definitivamente só, sem ter a esperança como companheira. Nem futuro eu guardava."
Três horas e trinta minutos do dia vinte e dois de agosto de dois mil e treze... mas o dia que passou foi ríspido, daqueles que o peso da vida vem com tudo pra cima da gente e o tempo todo o “meu coração estava cheio de vazio”.
Carlos Conti, o jovem pai do pequeno Isaac – de 5 anos, perdeu a sua batalha para o câncer e saiu de cena para sempre na noite desta terça-feira.
Conti, que não passou dos 37 anos, recebeu o triste diagnóstico no início de 2011. Seguem as palavras dele em seu blog:
No início de 2011 fui diagnosticado com Sarcoma de Ewing, um tumor que atinge os ossos e as partes moles próximas do local onde ele está localizado, passei por uma cirurgia de 8 horas, 12 ciclos de quimioterapia e 25 aplicações de radioterapia. O tratamento propriamente dito encerrou-se em 24 de dezembro de 2011.
De lá para cá houve vitórias, mas o dia 20 de agosto de 2013 seria o seu último. Já estava escrito.
Conheci o Conti na década de 90 e, logo no início, víamos que ele era um rapaz completamente apaixonado pela vida, e suas marcas registradas eram o seu sorriso e o cacoete no piscar dos olhos.
O tempo passou, tomamos rumos diferentes, mas o danado do facebook sempre me atualizava sobre ele, seu lindo casamento, sua fé inabalável, seu filhinho amado e, infelizmente, sobre a maldita doença que veio e que não queria ir embora.
Sempre quando alguém vai embora, eu me lembro do poeta Guimarães Rosa e de sua frase inesquecível. Nesta quarta o Conti ficou encantado. Choro até agora por ele, pela família e principalmente pelo pequeno Isaac.
Foi o Isaac que me fez escrever tudo isto aqui, foi o Isaac que me fez reler ATÉ PASSARINHO PASSA (Editora Moderna), do saudoso Bartolomeu Campos de Queirós, foi o Isaac que me fez sentir como ele, me fez lembrar que adultecer sem pai é duro, mas a vida é dura... ainda bem que temos a Literatura!
Eu corri para as palavras de Bartolomeu, procurei refúgio ali e, novamente, constatei que ATÉ PASSARINHO PASSA.
Este texto é sobre a brevidade da vida, sobre os desencontros eternos e, sobretudo sobre aquele momento frio em que o nosso coração está cheio de vazio.
Quero aqui homenagear o Bartolomeu por causa de sua delicadeza nas palavras, homenagear o livro ATÉ PASSARINHO PASSA (Editora Moderna), editado pela grandiosa Maristela Petrili de Almeida Leite e o pequeno Isaac (esperando que ele conheça este livro no futuro).
Daniel querido, o Sam também precisa conhecer!
Meu pai também já se foi e eu tinha apenas 2 anos. Acho que foi por isso também que fiquei tão devastado com a partida do Conti. Sempre fico arrasado quando me deparo com crianças perdendo os seus pais.
"Não conheço, além do imenso tempo, nada que tenha existido para sempre. Até o silêncio passa."
Me despeço com estas belas palavras de Bartô.
ATÉ PASSARINHO PASSA precisa ser lido e relido POR TODOS não pelos inúmeros prêmios, não por estar abrindo o meu blog de Literatura Infantojuvenil, mas porque é VIDA.
Agradeço à Literatura Infantojuvenil por me salvar sempre e até a próxima, meus queridos amigos!
Renato Coelho
Apaixonado pela Literatura Infantojuvenil.
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Há muita graça no compartilhar seus sentimentos, ao que o leva a consolar vidas, a levar os sonhos que todos precisam viver… que a ternura do sentir possa ser espalhado, Renato! Beijos!
ResponderExcluirQue lindo texto Renato, emocionante relato!!!!!! E mais ainda, estou imensamente feliz com este blog encantador, vida longa!!!!!!!! Mil abraços!!!!!!
ResponderExcluirRenato, num momento particular de perda seu texto chegou acalentando meu coração 'tão cheio de vazio' e, ao mesmo tempo, tão cheio de agradecimento, generosidade e esperança. Obrigada por partilhar emoções e sentimentos tão fortes na fragilidade e efemeridade da vida terrena.
ResponderExcluirO amor à literatura para a infância e juventude nos aproximou; ao ler suas palavras lembrei-me de um dos primeiros livros que li sobre partidas - " História de Uma Folha" [Léo Buscaglia]: "Ela fechou os olhos e adormeceu. Não sabia que a primavera se seguiria ao inverno, que a neve se derreteria e viraria água. Não sabia que a folha que fora, seca e aparentemente inútil, se juntaria com a água e serviria para tornar a árvore mais forte. E, principalmente, não sabia que ali, na árvore e no solo, já havia planos para novas folhas de primavera."
Beijão carinhoso e o desejo de mais, muito mais aqui no 'Passarinho' - até a próxima...
Teresa, muitíssimo obrigado pelas palavras dadivosas! A Literatura Infantojuvenil me salva sempre deixando o peso da vida menos pesado... Tudo o que faço em prol de sua Arte é agradecimento de alma. Beijos, Renato.
ResponderExcluirDaniel querido, muita honra ter o seu comentário aqui no ninho do PASSARINHO! Suas exclamações de afeto encheram o ninho de alegria!
ResponderExcluirObrigado, obrigado e um abração! Renato.
Ana querida, que lindas palavras! Meu coração, embora ainda triste, se alegra com você por aqui! Curioso este texto dolorido me proporcionar alegria, alegria vinda de vocês com os seus comentários de vida. Muito obrigado por tudo e um grande beijo, Renato.
ResponderExcluirRenato,
ResponderExcluirParabéns pelo blog! Obrigada por compartilhar conosco um pouco da sua paixão pela Literatura Infantil por meio de histórias fascinantes. Me emocionei ao ler o seu texto, que é de uma beleza e ternura arrebatadoras.
Deniz,
ResponderExcluirAssim o meu coração para!!!
Muito obrigado pelas palavras de alma!
Beijão! Renato
Caro Renato, parabéns pelo blog, iniciado num momento de grande pesar. A literatura infanto-juvenil trabalha com o ser humano em formação, cheio de ânsias e anseios, afogado num mar de possibilidades, de perigos e de desafios. Tudo conspira para que ele se torne muito cedo um cínico, um descrente, um desiludido. Os livros podem ajudá-lo a trilhar caminhos mais inspirados neste mundo de superficialidade, de busca do sucesso e do dinheiro fáceis, dos prazeres efêmeros, das conquistas de Pirro. Os exemplos que lhe chegam passaram longe das bibliotecas. Seus méritos são indigentes. Daí a importância e a responsabilidade da literatura infanto-juvenil. Jovem que lê não é presa fácil da charla dos pascácios. Ninguém melhor que você, pela competência e sensibilidade, para tratar desse segmento da literatura tão necessário.
ResponderExcluirCaríssimo Julio,
ResponderExcluirMuito emocionado com as suas palavras inspiradoras!
É uma grande honra tê-lo por aqui pelo grande profissional das letras e dos traços que você é! Sobretudo pelo grande pai e avô que as suas filhas e netas (lindas) possuem!
Muito obrigado, pois suas impressões e apoio são uma verdadeira dádiva!
Grande abraço, Renato.
Renato, parabéns pelo blogue e pelo texto, pungente e tocante. De tempos em tempos, tenho de experimentar a brevidade da vida. Isso é terrível, mas o livro do grande artista da vida, Bartô, e o seu belo texto vêm trazer o conforto para admirar o passarinho que passa, com o silêncio. Mas longa vida ao seu blogue, que nós, apaixonados por livros, merecemos. Um grande abraço.
ResponderExcluirDa beleza e magnitude que há em um bocado de tristeza! Belo texto!
ResponderExcluirLindo o seu relato, Renato. Ótima esta sua iniciativa de criar um blog, para nos presentear com os textos que virão, a todos nós que admiramos a sua cultura e sensibilidade.
ResponderExcluirRenato, confesso. Chorei com você e por você. Por ter passado pelo que passou. Saiba que Você nunca passará do meu coração. A vida é dura. Mas a literatura a umedece. Beijo.Si.
ResponderExcluirRenato, emocionante como você conseguiu encontrar a beleza no meio da dor. Quanta saudade deve sentir esse filho que ficou órfão do pai com tão pouca idade, como você. Ninguém tem a dimensão dessa dor, só quem a sente. Que a força da literatura o ajude, cada vez mais, a ser essa pessoa sensível e importante para dar sentido à brevidade da vida. Você é imprescindível, sorte dos amigos que podem partilhar da sua arte.
ResponderExcluirOlha, Renato, seu texto é aquela coisa que faltava na crítica literária: palavras nascidas no livro a ser comentado, mas palavras que fervem também literariamente. Isso que é cr'ítica, criar outra estética a partir da leitura que você faz do autor. Assim, acabamos ficando com duas experiências literárias: a do autor que vc comenta e a estética delicada e requintada de seus comentários. Estou amando seu blogue. Beijos, parabéns do fundo do coração. Lindo!
ResponderExcluirRenato, fiquei sabendo do blog. Rodei em torno. Hoje vim a ele. Gosto de ouvir falar sobre, pra depois chegar à casa. Constatar se há verdade no que os outros disseram a respeito ou me espantar com minha própria opinião diante do real ou do imaginário. Talvez por isto goste das casas com quintais, que nos distanciem as portas para estimular e valorizar descobertas. Aplico esta forma de perceber o óbvio do cotidiano, à literatura. Gosto de literatura, de textos com quintais. Não descritivos, mas que me permitam passear sem pressa, lagarteando como aconselharia Manoel de Barros ou não me poupando espantos como convém à filosofia. Há tantas casas quanto blogs neste universo, não é verdade, meu caro, por isto minha cautela na chegança. Mas, aqui estou, arejado pelo quintal que me proporcionou seu texto, feliz de encontrar Bartô e, ainda, Moriconi. Mineiramente, Bartô, meu editor, me surpreende sempre; Moriconi me chegou como um soco, em dupla com Tino Marcos em "O invisíveis". A literatura de Bartô é chá pra aliviar males e provocar magias. Sua percepção disto, misturando vidas ao vário literário: "Este texto é sobre a brevidade da vida, sobre os desencontros eternos e, sobretudo sobre aquele momento frio em que o nosso coração está cheio de vazio". "Meu pai também já se foi e eu tinha apenas 2 anos. Acho que foi por isso também que fiquei tão devastado com a partida do Conti. Sempre fico arrasado quando me deparo com crianças perdendo os seus pais." A verdade e o verbo, em alguns textos têm radical comum. É o caso aqui. Peço licença, cerro a porta da sala, passo pelo quintal, puxo e tranco o portão... Sortes, Renato. Volto em breve.
ResponderExcluirRenato, que texto leve, intenso! Amolece até coração de pedra!! Fico muito grata por ler isso esta amnhã! Abraços.
ResponderExcluirVeja, Deslocou-me o A! Será que devo lê-lo também amanhã?
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